• Em todas as etapas de produção, desde a aquisição de matérias-primas, gestores e funcionários serão orientados a desenvolver e priorizar as “ferramentas” do afeto inclusivo, da confiança mútua, da segurança capaz degranjear a paz interior. Os elos da cadeia de fornecimento se transformarão em comunidades interdependentes.
• O mesmo acontecerá em todas as etapas de comercialização e chegada ao mercado: canais de vendas e consumidores finais se converterão em comunidades.
• As empresas até poderão doar um número de horas remuneradas a seus funcionários para que cultivem o relacionamento com essas novas comunidades.
• O lucro continuará a existir, é claro, mas também será utilizado para recompensar o comportamento interdependente e para cuidar das comunidades.
Embora a espiritualidade dos negócios não deva jamais ser confundida com uma perspectiva religiosa, é interessante notar a disseminação ecumênica da idéia de “dar”, vista como forma de participar na construção de um mundo no qual todos tenham lugar. Trata-se de um sentimento universal que aparece em diferentes credos, como explica Paulo Vieira de Castro:
• Para os judeus, a caridade é responsabilidade da comunidade.
• Para os católicos, toda a humanidade tem direito ao usufruto dos bens.
• O mundo islâmico dá o exemplo com a prática do zakah, a obrigação de entregar 2,5% do lucro aos mais pobres –para os muçulmanos, só a caridade purifica o lucro obtido.
• Para os hindus, o homem veio ao mundo de mãos vazias, regressando sempre de mãos vazias, e dar é, para eles, a única forma de purificação, pois só as ações filantrópicas darão bom carma.
• Para os budistas, o desapego aos bens materiais é o que faz com que qualquer ação tenhacomo intenção gerar felicidade aos outros e a si próprio.
Se um gestor quiser entender de forma completa a idéia da interdependência nos negócios, terá de voltar à necessidade primária do ser humano: a auto-realização.
Diferentemente da idéia propagada pela sociedade do conhecimento, em que se mostra fundamental “conhecer”, a proposta central passará a ser “auto-realizar-se”.
Admito que não é fácil mudar a lógica, sobretudo nas sociedades ocidentais. É preciso desapegar-se um pouco de nossa sociedade atual para compreender esta frase:
“Tudo que dei é meu, continua comigo. Tudo que restará no final será o que compartilhei”.
Será possível ter esse sentimento em relação ao que simplesmente compramos ou vendemos?
Madre Teresa de Calcutá afirmava que, “quanto menos temos, mais temos para dar”, e na rua vemos isso claramente. Basta comparar o impacto que tem sobre nós um sorriso ou um abraço sincero com o impacto do consumo, que gera satisfação fugaz e temporária. Para que isso aconteça no meio corporativo, contudo, talvez sejam ne cessários às empresas uma nova transparência de propósitos, novos valores e um novo enfoque relacional, traduzidos na criação de comunidades de proximidade real.
Uma nova consciência para o mundo dos negócios terá, necessariamente, de passar pela responsabilidade de, como diria Mahatma Gandhi, sermos o exemplo que queremos ver nos outros. Mais uma vez usa mos o verbo “dar” – nesse caso, dar o exemplo. Por onde começar tamanha transformação nas empresas?, perguntará o leitor. Acreditar ser possível é o primeiro passo. Acreditar que você é parte da solução, o segundo.
Entender que você é também parte do problema, o terceiro. O resto você já sabe. A esse respeito, Max Planck, um dos “pais” da física quântica, afirmou que à entrada dos portões do templo da ciência estão escritas as palavras: “Deves ter fé”. Ter fé talvez não seja crer no que não vemos, mas criar o que não vemos. A realidade que se vive nas ruas fez-me antecipar, ainda, o próximo passo, uma nova doutrina econômica aparentada a um capitalismo empreendedor elevado a seu expoente máximo de responsabilidade inclusiva. Nele, assim como na natureza, assistiremos ao retorno à natural evolução criativa, em que nos descobriremos todos maiores que a soma das partes. Além de jo garmos com a idéia de interdependência, passaremos a reconhecer no fator “impermanência” uma variável estratégica de oportunidade, cabendo à alta gestão potencializá-la, em vez de isolá-la como a uma bactéria nociva. Perante uma humanidade que se debate entre os anseios de uma nova consciência nos negócios e buscas individuais de um sentido mais amplo para a existência, confrontamo-nos com novos ideais de espiritualidade. Só esta parece ser capaz de despertar o princípio organizador, totalizador, inte grador de todas as potencialidades humanas. Como poderia ser diferente nas relações de consumo? Tudo na vida é uma doce responsabilidade, não mero jogo de sorte ou azar. Esse é um entendimento que, desde meados dos anos 80, vem dando origem à figura do gestor servidor. Aristóteles, que nunca leu um livro de administração de empresas em sua vida, já sabia que somos aquilo que fazemos repetidamente. A excelência não é um ato, mas um hábito. O que falta então para romper com algumas de nossas rotinas? Acreditar que, além de desejável, é possível. Seguindo a máxima de São Francisco de Assis, deveremos começar por fazer o que é ne- cessário, depois fazer o possível, e logo estaremos fazendo o impossível. Entre aqueles que cuidam de quem vive na rua, muitos já perceberam que obedecem, agora, a novos paradigmas: o da interdependência e o do dar. A onda criada [na Europa e nos EUA] com movimentos como o Free Hugs (o nome, abraços grátis, é auto-explicativo) ou o Banco de Tempo (que prega a simples troca de tempo por tempo) veio a provar exatamente isso. Está, pois, lançado o mais nobre desafio aos marketeers: a gratuidade –ou, como dizemos cá em Portugal, a gratuitidade.
Fonte: HSM Management Update nº 57 - Junho 2008
http://www.markgerenciamento.com/informativo1.php
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Artigo enviado por JoanaRSSousa- http://joanarssousa.blogspot.com/
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